quarta-feira, 13 de março de 2013

Pesquisa revela perfil desolador das Ilhas de Belém

Estudo mostrou condições de vida desfavoráveis dos moradores das Ilhas de Jutuba, Urubuoca e Ilha Nova

Segundo dados do IBGE, a cidade de Belém possui 2.100.319 habitantes. Mas uma pesquisa realizada por alunos do Instituto Federal do Pará (IFPA) revela que essa população pode ser muito maior. É que a população das 39 Ilhas do entorno da capital não entra na contagem do contingente populacional do município, logo, essas pessoas também são excluídas dos serviços básicos como educação e saúde.

A pesquisa foi realizada pelas alunas do curso de Gestão de Saúde Pública do IFPA, Alline Freitas e
Gerciene Lobato. O trabalho foi orientado pela coordenadora do curso, professora Msc. Maria Helena Cunha, com contribuições da membro do departamento de epidemiologia da SESPA, Liduina Trindade. O projeto teve como objetivo fazer uma análise do perfil demográfico, habitacional e educacional das Ilhas de Belém, especialmente da Ilha de Jutuba.

A Ilha de Jutuba se enquadra no cenário amazônico como um espaço com condições de vida desfavoráveis. A região é marcada pelo saneamento precário, falta de assistência integral de saúde, ausência de água potável, escolas com nível educacional inferior ao ensino fundamental e presença de casas com poucos cômodos, que abrigam um grande número de pessoas. A comunidade não possui uma fonte de renda e depende das entressafras e da maré para sobreviver.

Através da pesquisa, as alunas perceberam que as políticas públicas voltadas para a comunidade ribeirinha são principiantes. “Há apenas programas de compensação social como o ‘Saúde da Família’”, dizem elas. O programa é o mesmo que atende no meio urbano convencional e, segundo as alunas, isso consiste numa falha do serviço de saúde, pois as populações ribeirinhas possuem características peculiares, comparadas a outras populações.

As alunas explicam que os problemas da população da Ilha não se restringem a doenças, mas também aos aspectos demográficos, habitacionais e educacionais. Daí a importância de se ter políticas públicas eficientes que contemplem as necessidades dessa população. O IFPA já realiza um projeto de intervenção em saúde em parceria com a Cáritas Metropolitana de Belém (Camebe), mas Alline e Gerciene lembram que também é preciso levar educação de qualidade, proporcionar saneamento ambiental, condições de moradia, água de qualidade, infra-estrutura básica para acesso às residências e assistência integral à saúde.

Por não se sentirem assistidas, as pessoas procuram por atendimento na Ilha de Cotijuba ou Icoaraci, distrito de Belém. Alline explica que, quem busca atendimento em Cotijuba reclama dos dias pré-estabelecidos para consulta, chegando a mencionar que é como se tivessem dia para adoecer. “Como a localidade não dispõe dos serviços, nós procuramos desenvolver tecnologias alternativas, como a de abastecimento de água, que possam contemplar critérios de sustentabilidade, viabilidade técnica e econômica e adaptabilidade às particularidades locais, inclusive aquelas ligadas às tradições culturais que marcam a comunidade”.

No que tange à educação na Ilha de Jutuba, as pesquisadoras identificaram apenas duas escolas com ensino fundamental menor e uma delas é da Igreja Católica. “Muitos até desconhecem a existência dos dois espaços”, lamentam. Quanto ao aspecto demográfico, a pesquisa revela que há um contingente populacional considerável, com a presença maciça de homens de baixa escolaridade e pequena compensação financeira. No aspecto habitação, somente algumas casas foram beneficiadas pelo projeto Sodis, implantado pela Camebe, e, ainda assim, segundo as alunas, os moradores reclamam, pois o abastecimento de água depende da chuva. “Quando não chove, eles precisam buscar água na torneira pública de Cotijuba”, contam. Eles ainda têm de enfrentar as dificuldades para armazenar e transportar a água nas embarcações.

Eventualmente também há na localidade projetos da Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), de oferecimento de serviços como atendimento médico, odontológico e oftalmológico, exames e emissão de carteiras de identidade e de trabalho, além de atividades de combate ao escalpelamento, estímulo à leitura e o cultivo de plantas medicinais. A Pastoral da Criança faz o acompanhamento das crianças e auxilia as mães a evitarem agravos como desnutrição e anemia. “O problema é que essas ações não são permanentes”, lembra a orientadora do trabalho, Helena Cunha.

O trabalho vem sendo desenvolvido desde 2008. Hoje, além da Ilha de Jutuba, também foram analisadas as Ilhas de Ilha Nova e Urubuoca. Para a coleta de informações realizou-se pesquisa de campo utilizando entrevistas e um questionário com perguntas específicas aos moradores. A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética do Instituto Evandro Chagas (IEC) e já foi convocado duas vezes para apresentação em congressos.

Números - Em Jutuba, 10,58% são analfabetos e 47,12% têm apenas o ensino de 1ª a 4ª série. Há casas que abrigam um grande número de pessoas (42,11% têm cinco ou mais pessoas) e a ocupação da população está relacionada a atividades como a pesca e o cuidado do lar.

O maior contingente populacional da Ilha concentra-se na faixa etária de 15 a 25 anos (21,88% correspondente ao sexo masculino e 21,10% ao sexo feminino). Há um baixo número de idosos, enquanto que a parcela de 15 a 59 anos é relativamente grande quando comparada a esse vértice, indicando que a população em idade produtiva é maior que a de idosos, e que a base possui um número considerável de crianças, o que indica um contingente significativo de mulheres em idade fértil, que corresponde as faixas etárias de 10 a 49 anos. 

Os dados mostram que 15,04% dos homens são analfabetos e apenas 6,19% são mulheres. Em termos percentuais, no ensino básico de 1ª a 4ª série, as mulheres (48,45%) estão em um nível mais elevado em relação aos homens (46,02%) e apesar de estarem à frente também no ensino médio, apenas os homens conseguiram representatividade no nível superior.

Por Luiz Cláudio Fernandes
Jornal Diário do Pará, 21 de fevereiro de 2011

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